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Doces e Licores Conventuais – Doce Tentação

 

 

A doçaria conventual portuguesa originária dos conventos e dos mosteiros conta com muitos séculos de história. Das mãos dos monges e das monjas criaram-se doces e licores verdadeiramente divinais. Uma história de árduo labor, paciência e saber fazer, que engrandeceu gastronomia portuguesa de reconhecimento internacional.

 

Os doces conventuais sempre estiveram presentes nas refeições, por vezes parcas, por vezes faustosas, que eram servidas nos conventos e, os muito apreciados licores, destila­dos a partir de várias plantas, eram usados para fins medicinais.

 

Os ingredientes principais desta doçaria requintada, feita de amor, dedi­cação e muita paciência, são as gemas, o açúcar e as amêndoas.

 

Foi a partir do século XV, com a expansão do comércio do açúcar, vindo das antigas colónias portuguesa, que os doces atingi­ram maior notoriedade. À inspiração dos monges e das monjas juntou-se o açúcar, e as mãos sábias dos que o trabalhavam pacientemente perceberam que a calda de açúcar permitia a conservação dos doces durante muitos dias.

 

Entre os séculos XVIII e XIX, Portugal era o maior produtor de ovos da Europa. Boa parte das claras dos ovos eram exportadas e usadas para, entre outros fins, engomar roupas elegantes da corte europeia.

 

Como chegaram estas receitas até nós? Foi a partir de 1834, com a extinção das Ordens Religiosas, que as receitas saíram dos conventos e passaram de mão em mão, de gera­ção em geração, para que, hoje, para nossa “devoção”, as deliciosas receitas de doces conventuais portugueses permaneçam bem vivas e na nossa mesa.

 

Várias casas e pastelarias do concelho de Alcobaça conservam ainda hoje a tradição dos Doces e Licores Conventuais dos Mosteiros de Alcobaça e de Coz, masculino e feminino respetivamente. Habitualmente em novembro, a Câmara Municipal de Alcobaça organiza a Mostra Internacional de Doces & Licores, desde 1999, juntando saber e tradição de casas e mosteiros de todo o país e também de vários países convidados.

 

 

 

 

Porque é que os Doces e Licores Conventuais estão tão próximos da identidade alcobacense?

Por António Valério Maduro

 

A valorização das identidades e culturas alimentares entrou definitivamente na ordem do dia. O turismo gastronómico e o enoturismo tornaram- se alavancas do desenvolvimento local e regional. Nesta linha de entendimento, salvaguardar a identidade cultural implica garantir a autenticidade da herança evitando o efeito perverso do fenómeno artificial da turistificação. Alcobaça cresceu à sombra do mosteiro e a longa duração dos monges brancos no território deixou marcas culturais profundas, um património material e imaterial singular que cumpre valorizar e potenciar.

 

Os mosteiros cistercienses estão associados à criação de vinhos, destilados e licores. Em Alcobaça produziam-se vinhos brancos, vermelhos, vinhos de feitoria e aromatizados, nomeadamente com mel, licores (nomeadamente de ginja) e destilados. Destacam-se os vinhos das encostas de Aljubarrota que, como os demais, recebiam arrobe (geleia de mosto), produto que ajudava a elevar o grau alcoólico e a conservação, para além de os adoçar e maçãs camoesas que os frutavam. Os vinhos podiam ser confecionados com anis, rosmaninho ou absinto, fervidos com canela, cravo, noz-moscada, pimenta, receber almíscar e âmbar. Os vinhos melhorados (vermutes) tinham consumo em festas e banquetes.

 

A produção de doces e geleias de frutas era entregue pelo mosteiro a doceiras da região. Doces de laranja, cidrão, pêssego, abóbora e figo eram os mais requisitados. William Beckford, o excêntrico aristocrata inglês que visita o mosteiro em 1794, menciona a fruta escorrida que designa por “candied apricots and oranges”. A pera e a abóbora coberta (em calda de açúcar) também entram no consumo festivo. O arroz doce e o manjar branco são presenças regulares nas festividades litúrgicas (na 5ª Feira Santa, na consoada de véspera de S. Bernardo) e no serviço da hospedaria. O manjar de língua de vaca também é mencionado na documentação monástica. A importação dos designados actualmente por doces conventuais trazia ao mosteiro os bolos de Almoster e as morcelas de Arouca.

 

Julia Pardoe, uma visitante ilustrada oitocentista, refere que a comunidade se notabilizava pela produção de tortas, doces e confeitos. Já o historiador Tito Larcher destaca as queijadas do Bárrio, as tortas de Aljubarrota, os esses de Alcobaça e o pão de ló de Alfeizerão, mencionando o autor, que este fabrico tinha a mão das monjas do mosteiro feminino de Cós. A tradição doceira dos antigos coutos cistercienses é aliás convocada na receção aos participantes do IV Congresso de Turismo (1911) que visitaram a região de Alcobaça. Os congressistas deleitaram-se com as queijadas do Bárrio, o pão de ló de Alfeizerão e o arroz doce de Alcobaça, ou seja, tudo o que de melhor tinha para oferecer a tradição da doçaria conventual segundo notícia da imprensa. A faculdade da apropriação da herança abre igualmente caminho à criatividade e inovação caminho que os pasteleiros alcobacenses têm trilhado com inegável mestria.

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